Prevent Senior tem produto escasso e sofre grave crise

Empresa focada em plano de saúde para idosos é investigada pela CPI da Covid e pela ANS

Até a deflagração da pandemia, em março do ano passado, a Prevent Senior era considerada um caso bem sucedido no setor. Isso porque a operadora vende plano de saúde individual ao público idoso, a preços acessíveis, e tem lucro, graças a um trabalho azeitado de atenção médica primária que ajuda na prevenção de casos mais graves. Mas a covid-19 expôs o lado frágil de sua estrutura e desencadeou uma
série de decisões, por parte de seu comando, que levou a uma grave crise de imagem.

A Prevent Senior está sendo acusada, pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, do Senado Federal, de ter alterado prontuários de pacientes, realizado uma pesquisa médica sem ter licença para isso e de distribuir hidroxicloqoquina, entre outros medicamentos, cuja eficácia para prevenir ou combater a covid-19 não tem comprovação científica. A companhia também está sendo investigada pela
Agência Nacional de Saúde (ANS).

O lado frágil da Prevent Senior, segundo especialistas ouvidos pelo Valor, é seu atendimento de alta complexidade. Fernando Parrillo, presidente da Prevent Senior, negou ao Valor que tenha pouca estrutura para tratar casos de alta complexidade e que isso teria atrapalhado a operadora no combate à covid. A Prevent registrou 4 mil mortes de um total de 18 mil internados pela doença. “Não é verdade. Temos vários exemplos de alta complexidade. Iniciamos cirurgia robótica para operar inflamações da próstata, por exemplo.

Somos uma das primeiras operadoras a usar tecnologia de radioterapia intraoperatória para mulheres com câncer de mama, o que evita sessões de radioterapia posteriores. Fizemos investimentos em ablação por radiofrequência para cânceres de rins e fígado. Isso tudo fora do rol da ANS. São investimentos de mais de R$ 400 milhões, para tratamentos a que pessoas comuns, da maioria dos planos de saúde, não teriam acesso. Sem contar os hospitais, como o Sancta Maggiore do Morumbi, que têm leitos para acompanhantes, com investimentos de mais de R$ 3 milhões”, disse Parrillo, que respondeu outras perguntas (ver abaixo).

A insistência da Prevent Senior em torno da hidroxicloroquina, segundo fontes, tem um viés econômico porque seu custo é baixo, mas não é a única explicação: envolve uma crença cega em torno da eficácia do medicamento. A própria mãe dos fundadores da operadora – Fernando Parillo e seu irmão Eduardo Parillo – foi tratada com hidroxicloroquina, medicamento defendido pelo presidente Jair Bolsonaro, e seus apoiadores, como sendo capaz de evitar a covid ou curar quem é contaminado. “Acho que entraram num ufanismo, de salvadores da pátria. A história da medicina está cheia disso, mas o mundo mudou. Não dá mais para conduzir pesquisa sem autorização, hoje temos comitês de ética”, disse uma fonte, lembrando o caso Tuskegge, no Alabama (Estados Unidos). O governo americano conduziu, entre 1932 e 1972, uma pesquisa com 600 homens negros com sífilis sem qualquer autorização. Os pacientes não foram informados sobre seu diagnóstico e algumas das esposas foram contaminadas. O caso deu origem à criação dos comitês de ética, processos de indenização e um pedido de desculpas por parte do governo
americano.

A Prevent Senior fez um estudo com 636 pacientes, sem informa-los que estavam sendo medicados com a hidroxicloroquina, segundo denúncias divulgadas pela “GloboNews”. A empresa alega que tinha autorização. As denúncias mostram ainda que os médicos da Prevent eram obrigados a prescrever o “kit covid” aos internados e que os medicamentos eram enviados aos usuários para tratamento precoce.

Fernando Parrilo disse que “os médicos têm autonomia”. Uma fonte observou que a Prevent chegou a esse ponto “devido a uma combinação de decisões erradas. Podiam ter investido mais em alta complexidade porque não falta dinheiro para eles, mas ao mesmo tempo não tinham expertise para colocar isso em prática e no meio da pandemia não é simples. Isso associado à cloroquina, que todos usaram no começo porque não havia conhecimento, mas eles continuaram, mudaram CID, obrigaram médicos a prescrever, mandavam para casa do paciente”.

No nício da pandemia outros hospitais também usaram hidroxiclorina em pacientes internados – não havia um protocolo de como tratar a doença. Mas este medicamento parou de ser usado quando ficou demonstrado que sua eficácia não poderia ser comprovada. A Prevent também fez algo que outros hospitais não fizeram – embalou a hidroxicloroquina com outros medicamentos em um “kit” e despachou-o para a casa dos usuários do seu plano de saúde.

Em paralelo, num cenário em que a pandemia virou bandeira política, a companhia se aproximou do bolsonarismo, após as críticas do ex-ministro da saúde Luiz Henrique Mandetta sobre o grande número de mortes em seus hospitais, no início da pandemia. Na época, o presidente Jair Bolsonaro passou a defender a cloroquina. A Prevent se aproximou do Bolsonaro “para se proteger” das denúncias de Mandetta, diz uma fonte. O presidente da Prevent nega e diz que nunca esteve com Bolsonaro.

Entre março de 2020 e julho deste ano, ou seja, antes das atuais denúncias, a Prevent Senior ganhou 88 mil novos usuários. Há carência de planos de saúde individual para idosos, a preços acessíveis, no país.

Fonte: Valor Econômico