Postalis pretende leiloar carteira de crédito de R$ 1,7 bi

Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios, busca liquidez para créditos problemáticos na carteira
Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios, busca liquidez
para créditos problemáticos na carteira

O Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios, pretende leiloar sua problemática carteira de créditos privados de R$ 1,7 bilhão, apurou o Valor. A administração da fundação tomou a decisão depois de passar meses procurando no mercado gestores especializado em recuperação de créditos não pagos. O objetivo do leilão é retirar da carteira do Postalis definitivamente esses títulos que, a cada ano, por conta das provisões e equacionamentos necessários, contribuem para um aumento do déficit do fundo da ordem de R$ 200 milhões, de acordo com fontes.

Se entregasse a cobrança e recuperação dos ativos para um gestor especializado, seguindo o exemplo de vários outros fundos de pensão que possuem “papéis­problema” em suas carteiras, o Postalis teria de continuar “carregando” esses títulos. No entanto, o déficit do Postalis está em gigantescos R$ 5,6 bilhões desde 2014. No ano passado, o fundo, firmou um termo de ajustamento de conduta com a Previc, fiscalizadora do segmento, e ganhou prazo de um ano para reverter a situação. Mas diante dos problemas do portfólio hoje já é certo que o déficit não será revertido e o rombo deverá ser equacionado em 2016, com participantes e patrocinadora chamados a contribuir com novos recursos.

Entre os problemas que ajudaram a ampliar o déficit estão uma dívida passada, de R$ 1 bilhão, que os Correios têm com o Postalis e que deixou de pagar. E disputas judiciais com o BNY Mellon, administrador da carteira do fundo, sendo a principal delas o caso Fidex, um fundo em que o Postalis investiu e que, contrariando o regulamento, comprou títulos de dívida de Argentina e Venezuela. A decisão de leiloar a carteira de créditos traz algumas discussões. Não se sabe ainda qual será a empresa responsável pelo leilão, por exemplo.

Alguns gestores ouvidos pelo Valor avaliam que ao vender toda essa carteira, o Postalis terá de dar um desconto maior para garantir o eventual lucro de quem comprar os ativos. Ao tomar tal iniciativa, estaria gerando mais prejuízos aos seus participantes. Houve até quem questionasse se seria uma medida possível.

Do lado do Postalis, a decisão estaria relacionada com a liquidez do fundo, que precisa de recursos para pagamentos de benefícios, apesar de contar com dinheiro suficiente para honrar compromissos por cinco anos, mas não desejaria esperar para reaver, na Justiça, esses créditos problemáticos. O fundo deverá ficar atento ao valor da carteira no leilão, avaliou uma fonte. Se a oferta for, por exemplo, de 10% do valor de face dos papéis, a leitura é que não valeria aceitar tamanho prejuízo e melhor seria esperar a decisão da Justiça.

Procurado pelo Valor, o Postalis afirma que “de forma responsável vem formatando uma ampla oferta ao mercado dos seus ativos de crédito privado inadimplentes”. Como são ativos inadimplentes, provavelmente os valores ofertados deverão ser aquém dos valores de face dos papéis. No entanto, diz que caberá a eles aceitar ou não as propostas. O Postalis afirmou que por conta do termo de conduta, a Previc tem monitorado de perto a situação das carteiras de investimento. No documento assinado com o regulador, está expressa a obrigação do Postalis de fazer “esforços para gerar liquidez proveniente dos seus ativos inadimplentes”.

Dentro dessa carteira de crédito privado há algumas operações polêmicas como as aplicações em debêntures do grupo Galileo, que investiu na Gama Filho e UniverCidade, meses antes de ambas serem descredenciadas pelo Ministério da Educação (MEC), além de outros casos investigados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Mas no portfólio que deve ir a leilão não estará, porém, outro investimento controverso do Postalis, realizado na ATG, empresa que tenta lançar uma nova bolsa de valores no Brasil, que concorreria com a BM&FBovespa.

Em 2013, o Postalis investiu R$ 72 milhões em debêntures de uma empresa chamada RO Participações, que era de Arthur Machado, um dos donos da ATG, e fez um aporte na Risk Office, à época parceira da ATG. Também aplicou cerca de R$ 100 milhões em um fundo de investimentos em participações (FIP) que investiria na nova bolsa. A Previc analisa esses aportes, inclusive porque o Postalis ficou com 32% do FIP, mais do que a participação de 25% prevista pela regulação do setor. A nova administração do Postalis entregou as debêntures da RO e parte da participação no FIP, ao redor de R$ 30 milhões, para reenquadrar esse investimento e em troca aportou mais R$ 50 milhões para ficar com R$ 170 milhões em debêntures da Xnice, empresa criada para investir na ATG.

Esses papéis são remunerados a IPCA mais 9% ao ano. Nessa operação, as debêntures da RO foram avaliadas não a preço de mercado, mas “na curva”, que considera o carregamento do papel até o vencimento e alcançaram valor de R$ 90 milhões ­ a preços de mercado, valeriam nem metade disso. O Valor apurou que tal arranjo foi possível por conta de um acordo entre as partes e por um conflito societário entre ATG e Risk Office. Uma solução para as debêntures da RO era essencial para resolver o problema. A RO estaria prestes a ter seu rating rebaixado, o que representaria novo desenquadramento dos investimentos do Postalis.

Apesar da troca de papéis, portanto, o Postalis permanece exposto a um negócio duvidoso e arriscado para um fundo de pensão, que é a criação de uma nova bolsa de valores no Brasil. A avaliação da nova gestão, segundo fontes, é que o investimento atual é melhor remunerado e se o negócio não der certo, o valor será recuperado num curto prazo se os pagamentos continuarem em dia. Postalis e ATG não comentaram a renegociação e a Risk Office não retornou pedido de entrevista.